domingo, 18 de março de 2012

Aspectos nutricionais na endometriose


A endometriose representa uma afecção ginecológica comum, atingindo de 5% a 15% das mulheres no período reprodutivo e até 3% a 5% na fase pós-menopausa. Essa doença é definida pelo implante de estroma e/ou epitélio glandular  endometrial em localização extrauterina, podendo comprometer diversos locais (BELLELIS; PODGAEC; ABRÃO, 2011), definições estas bem esclarecidas na postagem anterior.
Atualmente vem sendo levantada a hipótese de fatores ambientais influenciarem a etiologia da endometriose, que é uma doença estrogênio-dependente. Alguns estudos têm apresentado uma relação entre a dieta e outras doenças entrogênio-dependentes (LITTMAN; BERESFORD; WHITE, 2001; TSUBURA et al., 2005), devendo esta conduta dietética ser avaliada para os casos de endometriose.
A revisão bibliográfica de Cochrane et al. (2004), constatou que vitaminas do Complexo B, Magnésio e a suplementação de ômega-3 podem exercer um papel anti inflamatório em pacientes com endometriose, contribuindo na melhora dos sintomas da doença, uma vez que a endometriose caracteriza-se pela extensa inflamação. Foi proposto que ácidos graxos ômega 3 e 6 podem melhorar os sintomas álgicos relacionados com a endometriose, modulando a biossíntese e a atividade bioquímica de prostaglandinas relacionadas à dor pélvica, desde que o consumo de ácidos graxos respeite o equilíbrio entre as proporções (COCHRANE et al., 2004).
O consumo de magnésio e vitaminas do complexo B estão relacionados à produção de prostaglandinas anti-inflamatórias e ao relaxamento miometrial. Além disso, uma dieta baseada em vegetais, vitaminas, ômega 3 e magnésio  diminui a ingestão de proteínas animais e, portanto, diminuindo o excesso de gordura corporal e a produção periférica de estrogênio (SESTI et al., 2007).
A produção de estrogênio, estimulada pelo excesso de gordura corporal, pode intensificar os sintomas da endometriose (SESTI et al., 2007). Sendo assim, é importante que a portadora de endometriose seja estimulada à perda peso, a fim de contribuir na melhora dos sintomas da doença.
O consumo excessivo de ácidos graxos ômega-6 intensifica o processo inflamatório e os sintomas decorrentes da doença. Gazvani et al. (2001) em um estudo in vitro identificou que as células endometriais de mulheres com e sem endometriose foram significativamente reduzidas na presença de concentrações equilibradas de ômega-3: ômega-6, quando comparado às células incubadas na ausência desses ácidos graxos essenciais. Como conclusão, os autores afirmam que o ômega-3 pode ter um efeito supressor sobre a sobrevivência in vitro de células endometriais, sendo este nutriente muito importante no tratamento da endometriose, através da redução da resposta inflamatória e modulação da função das citocinas inflamatórias.
A ingestão de fibras pode aumentar a excreção de estrogênio de acordo com Kaneda et al. (1997); Rose e Lubin (1997)  e poderia, dessa forma, desempenhar um papel inverso no risco de endometriose.
         Apesar da etiologia da endometriose ainda não estar bem definida, a importância da alimentação para a melhora no tratamento vem sendo estudada e incentivada, já que a doença promove um processo inflamatório, que pode ser intensificado com uma dieta inadequada.
Entretanto, segundo os pesquisadores, até o momento existem evidências insuficientes provenientes de estudos controlados para que se possa tirar conclusões adequadas quanto à utilização de dietas como fatores preventivos ou mesmo adjuvantes no tratamento da endometriose.
Alguns autores têm apresentado a hipótese de Bifenilos Policlorados (PCBs) participarem da etiologia da endometriose. Dentre os principais PCBs estão os ftalatos e bisfenol A, que são hidrocarbonetos aromáticos clorados, utilizados industrialmente, em especial na fabricação de plásticos.
A exposição aos 2,3,7,8-tetraclorodibenzo-pdioxina (TCDD) e PCBs ocorre em animais e seres humanos através da ingestão de alimentos e de água. As dioxinas (TCDD) são subprodutos da incineração industrial e da combustão, resultantes da fabricação de pesticidas e do branqueamento de papel. O bisfenol A é um composto encontrado nos plásticos, em especial em garrafas de plástico, revestimento de latas de alimentos e selantes dentais. Já os ftalatos são aditivos do plástico, que possuem a característica de torná-los mais fortes, macios e flexíveis, porém, também são utilizados em tintas, colas, repelentes de insetos, sprays e tintas para cabelo, esmaltes de unhas, xampus e desodorantes (MARCHESE, 2012).
Muitos desses poluentes ambientais são persistentes, com meias-vidas longas, podendo acumular-se no meio ambiente e mesmo nos organismos vivos, influenciando, dessa forma, negativamente o processo gestacional, a infância e o indivíduo adulto (CARPENTER, 2006). Dentre os poluentes químicos, o TCDD tem sido amplamente estudado, porque é considerado o poluente ambiental mais tóxico já produzido pelo homem (JACOBSON-DICKMAN; LEE, 2009). Entretanto, certos PCBs possuem toxicidade similar ao TCDD, podendo agir no comprometimento da função reprodutiva (BELLELIS; PODGAEC; ABRÃO, 2011).
Apesar da proibição dos PCBs nos Estados Unidos desde 1976, estes poluentes químicos mantém-se no ar, água e no solo, acumulando-se no tecido gorduroso de peixes, aves e mamíferos em todo mundo. Como resultado, a exposição humana aos PCBs ocorre principalmente através do consumo de produtos de origem animal e laticínios (TRABERT et al., 2010).  
Recentemente no Brasil, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) proibiu a utilização de bisfenol A (PCB) em mamadeiras, entrando em vigor a partir de janeiro de 2012, em função de seu efeito cumulativo no organismo humano, podendo trazer sérias consequências, dentre elas distúrbios endócrinos, aumento do risco de neoplasias, problemas cardíacos, puberdade precoce, infertilidade, aborto e obesidade (AMS, 2012).
Dentre os distúrbios endócrinos, vários artigos científicos têm apresentado a discussão da ingestão de PCBs como contribuintes no desenvolvimento da endometriose (COBELLIS et al., 2009; SIGNORILE et al., 2010; BALABANIČ; RUPNIK; KLEMENČIČ, 2011; SIGNORILE et al., 2012). Apesar de ainda existirem muitas contradições entre os estudos, este é um ponto relevante que deve ser estudado pelos nutricionistas, principalmente aqueles que desenvolvem trabalhos na área clínica, com atendimento às portadoras desta doença.

Karina Nunes de Simas

Nutricionista, Mestre em Ciência dos Alimentos - UFSC

Pós graduada em Nutrição Clínica Funcional



Referências bibliográficas

AMS – ASSISTÊNCIA MULTIDISCIPLINAR DE SAÚDE. Mamadeiras de Plástico com BPA são proibidas pela Anvisa. Disponível em: http://ams.petrobras.com.br/portal/ams/beneficiario/mamadeiras-de-plastico-com-bpa-sao-proibidas-pela-anvisa.htm. Acesso em: 05 de fevereiro de 2012.

BALABANIČ, D.; RUPNIK, M.; KLEMENČIČ, A.K. Negative impact of endocrine-disrupting compounds on human reproductive health. Reprod Fertil Dev., v. 23, n.3, p.403-416, 2011.

BELLELIS, P.; PODGAEC, S.; ABRÃO, M.S. Environmental factors and endometriosis. Rev. Assoc. Med. Bras, v.57, n.4,  July/Aug., 2011.

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COBELLIS, L.; COLACURCI, N.; TRABUCCO, E.; CARPENTIERO, C.; GRUMETTO, L. Measurement of bisphenol A and bisphenol B levels in human blood sera from healthy and endometriotic women. Biomed Chromatogr, V. 23, N.11, P.1186-1190, 2009.

GAZVANI, M.R.; SMITH, L.; HAGGARTY, P.; FOLER, P.A.; TEMPLETON, A. High omega-3:omega-6 fatty acid ratios in culture medium reduce endometrial-cell survival in combined endometrial gland and stromal cell cultures from women with and withoutendometriosis. Fertil Steril. V.76, n.4, p.717-722, 2001.

JACOBSON-DICKMAN, E.; LEE, M.M. The influence of endocrine disruptors on pubertal timing. Curr Opin Endocrinol Diabetes Obes, v.16, n.1, p.25-33, 2009.

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SIGNORILE, P.G.; SPUGNINI, E.P.; MITA, L.; MELLONE, P.; D'AVINO, A.; BIANCO, M.; DIANO, N.; CAPUTO, L.; REA, F.; VICECONTE, R.; PORTACCIO, M.; VIGGIANO, E.; CITRO, G.; PIERANTONI, R.; SICA, V.; VINCENZI, B.; MITA, D.G.; BALDI, F.; BALDI, A. Pre-natal exposure of mice to bisphenol A elicits an endometriosis-like phenotype in female offspring. Gen Comp Endocrinol, v. 168, n.3, p.318-325, 2010.

TRABERT, B.; DE ROOS, A.J.; SCHWARTZ, S.M.; PETERS, U.; SCHOLES, D.; BARR, D.B.; HOLT, V.L. Non-dioxin-like polychlorinated biphenyls and risk of endometriosis. Environ Health Perspect, v.118, n.9, p.1280-1285, 2010.

2 comentários:

  1. Parabéns pelo excelente artigo, Karina! Gostaríamos que adaptasse esse seu artigo para o público leigo e publicasse em nosso Portal. Poderiam nos enviar o contato dela? Grato. Equipe Portal Meu Nutricionista.

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