domingo, 6 de maio de 2012

Técnica dietética: preservando o valor nutricional dos alimentos


O estilo de vida atual, associado a mudanças de hábitos alimentares expõem o indivíduo a uma série de fatores de risco para as doenças e agravos não transmissíveis e a fome oculta. Esta é relacionada a deficiência de um ou mais micronutrientes na alimentação diária, consequência de dietas desequilibradas, sedentarismo, excesso de alimentação industrializada, dentre outros fatores sociais (LIMA et al., 2012). O ato de alimentar é uma das atividades mais importantes do ser humano, seja por razões biológicas ou pelas razões sócio-culturais que envolvem o comer, por isso, a escolha do sistema para preparo dos alimentos é fundamental para sua saúde (BARROS et al., 2011).
A técnica dietética é a sistematização e o estudo dos procedimentos para tornar possível a utilização dos alimentos visando à preservação do valor nutritivo e à obtenção dos caracteres sensoriais desejados da preparação (PHILIPPI, 2003). Existem alguns objetivos que devem ser alcançados no planejamento de cardápio, seja individualmente ou para coletividade. São eles: dietético, digestivo, nutritivo, sensorial, higiênico, operacional e econômico (PHILIPPI, 2003). Para que os quatro primeiros objetivos sejam alcançados existe uma correlação direta com a escolha adequada da técnica dietética para pré-preparar e preparar os alimentos e estas escolhas devem minimizar as perdas nutricionais deixando os alimentos mais facilmente digeríveis e comestíveis sem descaracterizar seus atributos sensoriais. Existem dois tipos de energias que são aplicadas aos alimentos nestas etapas de pré-preparo e preparo e em algumas delas existe comprometimento na preservação do valor nutricional (ARAÚJO et al., 2007).
Energia
Procedimento
Valor nutricional
Energia mecânica:
Operação de divisão e separação
Picagem, ralação, coação, moagem, filtração, peneiração, centrifugar e descascar
Sempre que possível utilizar o resíduo e as cascas para não desperdiçar as fibras.
Energia mecânica:
Operação de união
Sovamento, batedura, mistura

Não há comprometimento do valor nutricional.
Energia térmica: Calor úmido
Água, pressão ou vapor: ebulição/fervura, banho-maria, fogo lento
Perdas nutricionais mais significativas.
Energia térmica: Calor seco
Ar livre (assado, espeto, grelha), ar confinado (forno, cabines) e corpos graxos: frituras, salteados
Não há comprometimento do valor nutricional.
Energia térmica: Calor direto
Chapa
Não há comprometimento do valor nutricional.
Energia térmica: Calor misto
Associação de calor seco e calor úmido (forno combinado)
Quando bem monitorado não há comprometimento do valor nutricional.
Energia térmica: Frio
Congelamento, branqueamento
Quando bem monitorado não há comprometimento do valor nutricional.
Adaptado pela autora.
Fontes: ARAÚJO et al.(2007); PHILIPPI (2003); RAMALHO et al.(2012)

Não adianta o planejamento ser bem feito, as compras e a qualidade dos alimentos estarem de acordo com os procedimentos legais se no preparo dos alimentos estes objetivos não forem contemplados, principalmente as características sensoriais. Ressalta-se que os seres humanos são muito mais emotivos e sempre iniciam suas refeições sensorialmente com o olfato e com a visão, e aí sim, se nestes quesitos a refeição for aprovada, levam a mesma até a boca para apreciação de seu paladar.
A energia térmica do tipo calor úmido empregada na cocção é sem dúvida a que mais induz a perdas nutricionais de vitaminas e minerais por dissolução principalmente vitaminas hidrossolúveis. Para melhor utilização, recomenda-se sempre aproveitar a água para outras preparações: arroz, caldos, sopas, etc. Este tipo de calor também abranda as fibras. A recomendação é que o calor úmido seja conduzido com reduzida quantidade de água e pouco tempo de cocção, com os alimentos inteiros, a fim de evitar perdas excessivas de vitaminas hidrossolúveis. 
O uso do vapor é recomendado, pois as perdas por dissolução são mínimas e ainda há o realce das características sensoriais, não sendo indicada a mistura de alimentos com texturas distintas em função dos tempos de cocção. Na cocção lenta utiliza-se o calor úmido. Pode ser aplicada a alimentos cujas fibras são mais duras e há necessidade de penetração de água para amolecer e quebrar a sua consistência. Neste tipo de cocção podem ser utilizadas ervas e temperos, que transferem o sabor ao líquido do cozimento, adiantando o seu preparo e tempero adequado (ARAÚJO et al., 2007).
Quando utilizados corpos graxos (óleos, gorduras) temos diferentes tipos de ponto humeo (ponto de decomposição da gordura, formação de fumaça e odor característico) e com a formação da acroleína temos possíveis irritações de mucosa do TGI, hepatotoxicidade e estímulo à formação de radicais livres. Pode ser aplicada a alimentos cujas fibras são moles e a penetração de calor é mais fácil, só que monitorando para não atingir o ponto humeo (ARAÚJO et al, 2007).
Cuidados devem ser tomados com os óleos e gorduras a serem utilizados no processo de fritura ou salteamento, uma vez que os ácidos graxos também podem sofrer decomposição em função da influência do calor, umidade, presença de luz, que propiciam maior formação de radicais livres e podem afetar as características sensoriais do óleo, principalmente o sabor e a cor.
As perdas nutricionais estão mais concentradas na energia térmica do tipo calor úmido e os principais nutrientes desperdiçados são as vitaminas hidrossolúveis (Complexo B e C). Nesta perda devemos analisar se o alimento, que está sendo preparado, é a fonte do nutriente perdido na refeição, pois assim será possível avaliar este desperdício, planejar sua reposição e minimizar os possíveis efeitos da fome oculta, priorizando a saúde dos indivíduos.

Gláucia Cristina Conzo

Nutricionista do SESI – Serviço Social da Indústria
Pós graduanda em Educação
Pós graduanda em Segurança Nutricional e Qualidade dos alimentos
Especialista em Saúde Coletiva pela ASBRAN
Aperfeiçoamento em Geriatria pela UNIFESP



Referências bibliográficas

ARAÚJO, W.M.C. et al. Alquimia dos alimentos. v. 2. Brasília, DF: Editora SENAC-DF, 1ª edição, p.181-215, 2007.
BARROS, R.M. et al. Análise e elaboração dos fatores de correção e cocção de alimentos. Anuário da produção de iniciação científica discente do Instituto de Pesquisas Aplicadas e Desenvolvimento Educacional (IPADE). v. 13, n. 16, maio de 2011.
LIMA, J.P. et al. Atividade e biodisponibilidade dos carotenóides no organismo. Revista Ciências em Saúde. v. 2, n. 1, janeiro de 2012.
PHILIPPI, S.T. Nutrição e técnica dietética. Barueri, SP: Editora Manole, 1ª ed., p. 03-08, 2003.
RAMALHO, S.A. et al. Influência do cozimento de alimentos em fogão solar tipo parabólico nas propriedades físico-químicas e microbiológicas. Scientia Plena. v.08, n.1, janeiro de 2012.

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