quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

SÍNDROME DO OVÁRIO POLICÍSTICO E O PROFISSIONAL NUTRICIONISTA

A Síndrome do Ovário Policístico (SOP) é uma das doenças endócrinas mais comuns, afetando cerca de 5 a 10% das mulheres em idade reprodutiva e uma das principais causas de infertilidade nos países em desenvolvimento (DIAMANTI-KANDARAKIS et al., 1999; KOIOU et al., 2011).
 
Sendo uma síndrome, a SOP é definida como uma coletânea de sinais e sintomas, os quais, de forma isolada, não podem ser considerados exclusivos (LUJAN et al., 2009; ROTTERDAN-GROUP, 2004). Contudo, existe uma grande controvérsia na caracterização clínica da SOP, levando a falhas na tentativa de compreender sua etiologia (AZZIZ et al., 2006).
 
Em 2003 um grupo de especialistas (ROTTERDAN-GROUP) se reuniu para definir um senso comum no que diz respeito aos sinais e sintomas da SOP. O resultado desse consenso define a SOP apresentando dois dos seguintes sintomas: (1) anovulação; hiperandrogenismo clínico e/ou bioquímico e (3) presença de ovário policístico na ultrasonografia. Entretanto, pacientes com SOP podem manifestar outras características tais como: menstruação irregular, hirsutismo (presença excessiva de pêlos pelo corpo), pele oleosa, acne, alopecia androgênica, qualidade de vida comprometida, aumento da ansiedade e depressão, resistência à insulina (RI), diabetes mellitus tipo 2 (DM2) e doenças cardiovasculares (DCV) (AZZIZ et al., 2006; BOOMSMA et al., 2006; HIMELEIN; TAHTCHER, 2006; MORAN et al., 2010).
 
A etiopatogenia da SOP é, ainda, incerta e fatores tanto genéticos como ambientais podem estar envolvidos. Legro e Strauss (2002) e Goodarzi (2008) demonstraram que a SOP é significativamente mais prevalente entre familiares do que na população em geral. De acordo com Kahsar-Miller et al. (2001) 35% das mães premenopausicas e 40% das irmãs das pacientes com SOP apresentavam a mesma desordem.
 
Outros autores propõem uma etiologia durante o desenvolvimento embrionário. Eisner et al. (2002) e Demissie et al. (2008) demonstraram que exposição pré-natal a andrógenos pode produzir fenótipo compatível com SOP em macacas, ovelhas e ratas; assim como Barnes et al. (1994) e Ghizzoni et al. (1996) em estudos com seres humanos. Enquanto que, Iba´n˜ ez  et al. (1998, 2007) e Pandolfi et al. (2008) sugerem que, em humanos, há uma associação entre baixo peso ao nascimento e SOP.
 
Em relação à fisiopatologia, a SOP é reconhecida como um desarranjo metabólico, caracterizada pelo aumento da RI, DM2, disfunção das células β da ilhota pancreática, intolerância à glicose (IG) e dislipidemia (YILDIZ et al., 2002; LAKHANI et al., 2004; BARBER et al. 2008; AGARWAL et al., 2010).
 
No aspecto reprodutivo a RI contribui para o hiperandrogenismo por meio do aumento na produção dos andrógenos ovarianos, tanto isoladamente quanto em sinergia com o Hormônio Luteinizante (LH) e, na redução da produção da globulina de ligação dos hormônios sexuais (SHBG) produzida pelo fígado (MORAN et al., 2010).
 
Mulheres com SOP, freqüentemente, apresentam RI mais severa em comparação a mulheres não-SOP. Teede et al. (2007) evidenciaram um mecanismo de RI distinto nas mulheres com SOP daquele visto em mulheres com  RI associada a obesidade.
 
Alguns autores apontam que mulheres com SOP têm maior predisposição à obesidade, o que pode agravar a RI e os distúrbios reprodutivos e metabólicos associados (GLUECK et al. 2005; EHRMANN et al., 2006). Segundo os trabalhos de Balen et al. (1995) e Legro (2000) 38 a 88% das mulheres com SOP apresentam obesidade visceral, o que aumenta o risco para doenças cardiovasculares.
 
De acordo com Alberti et al. (2007) a SOP é um fator de risco para DM2 e, mulheres com SOP intolerantes à glicose evoluem mais rápido para o DM2. Estudos recentes mostram ainda um aumento nas mortes por DCV em mulheres portadoras de SOP, além da prevalência de síndrome metabólica (SM).
 
Portanto, é crescente o número de trabalhos científicos corroborando a prevalência de IG, DM2, SM e DCV em mulheres com SOP. Sendo assim, é cada vez mais claro a importância da atuação do profissional nutricionista para a melhoria da qualidade de vida das pacientes, visto que, trabalhos reportam que uma redução de 5-10% do peso em mulheres com sobrepeso e obesas via restrição energética reduz os níveis circulantes de insulina e hormônios androgênicos, melhora o ciclo reprodutor e a fertilidade e diminui os fatores de risco para DCV (MORAN et al., 2003; MORAN; NORMAN, 2004; THOMPSON et al., 2008; SHAW et al., 2008).

Maurício Pereira Gouvinhas
Biólogo
Especialista em sistema reprodutor feminino pela Unifesp
Professor da Fundação Lusíada (Santos-SP)


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AGARWAL, N.; RICE, S. P. L.; BOLUSANI, H.; LUZIO, S. D.; DUNSEATH, G.; LUDGATE, M.; REES, A. – Metformin reduces arterial stiffness and improves endothelial function in young women with polycystic ovary syndrome: A randomized, placebo-controlled, crossover trial. J Clin Endocrinol Metab. v.95, p.722-30, 2010.

ALBERTI, K. G.; ZIMMET, P.; SHAW, J. – International Diabetes Federation: a consensus on type 2 diabetes prevention. Diabet Med. v.24, p. 451-63, 2007.

AZZIZ, R.; CARMINA, E.; DEWAILLY, D.; DIAMANTI-KANDARAKIS, E.; ESCOBAR-MORREALE, H.F.; FUTTERWEIT, W.; JANSSEN, O.E.; LEGRO, R.S.; NORMAN, R.J.; TAYLOR, A.E. – Position statement criteria for defining polycystic ovary syndrome as predominantly hyperandrogenic syndrome: an endrogen excess society guideline. J Clin Endocrinol Metab. v. 91, p. 4237-45, 2006.

BALEN, A.H.; CONWAY, G.S.; KALTSAS, G.; TECHATRASAK, K.; MANNING, P.J.; JACOBS H.S. – Polycystic ovary syndrome: the spectrum of the disorder in 1741 patients. Hum Reprod. v.10, p. 2107-11, 1995.

BARBER, T. M.; GOLDING, S.J.; ALVEY, C.; WASS, J. A.; KARPE, F.; FRANKS, S.; McCARTHY, M. I. – Global adiposity rather than abdominal regional fat distribution characterizes women with polycystic ovary syndrome. J Clin Endocrinol Metab. v.93, p. 999-1004, 2008.

BARNES, R.B.; ROSENFIELD, R.L.; EHRMANN, D. A.; CARA, J. F.; CUTTLER, L.; LEVITSKY, L. L.; ROSENTHAL, I. M. – Ovarian hyperandrogenism as a result of congenital adrena virilizing disorders: evidence of perinatal masculinization of neuroendocrine function in women. J Clin Endocrinol Metab. v.79, p. 1328-33, 1994.

BOOMSMA, C.M.; EIJKEMANS, M.J.; HUGHES, E.G.; VISSER, G.H.; FAUSER, B.C.; MACKLON, N.S. – A meta-analysis of pregnancy outcomes in women with polycystic ovary syndrome. Hum Reprod Update. v.12, p. 673-83, 2006.

DEMISSIE, M.; LAZIC, M.; FOECKING, E.M.; AIRD, F.; DUNAIF, A.; LEVINE, J.E. – Transient prenatal androgen exposure produces metabolic syndrome in adult female rats. Am I Physiol Endrocrinol Metab. v.295, p. E262-68, 2008.

DIAMANTI-KANDARAKIS, E.; KOULI, C.R.; BERGIELE, A.T.; FILANDRA, F.A.; TSIANATELI, T.C.; SPINA, G.G.; ZAPANTI, E.D.; BARTZIS, M.I. – A survey of the polycystic ovart syndrome in the Greek island of Lesbos: hormonal and metabolic profile. J Clin Endocrinol Metab. v.84, p. 4006-11, 1999.

EHRMANN, D.A.; LILJENQUIST, D.R.; KASZA, K.; AZZIZ, R.; LEGRO, R.S.; GHAZZI, M. N.; GROUP PCTS – Prevalence and predictors of the metabolic syndrome in women with polycystic ovary syndrome. J Clin Endrocrinol Metab. v.91, p. 48-53, 2006.

EISNER, J. R.; BARNETT, M.A.; DUMESIC, D.A.; ABBOTT, D. H. – Ovarian hyperandrogenism in adult female rhesus monkeys exposed to prenatal androgen excess. Fertil Steril. v.77, p. 167-172, 2002.

GHIZZONI, L.; VIRDIS, R.; VOTTERO, A.; CAPPA, M.; STREET, M.E.; ZAMPOLLI, M.; IBAN’ EZ, L.; BERNASCONI, S. – Pituitary-ovarian responses to leuprolide acetate testing in patients with congenital adrenal hyperplasia due to 21-hydroxylase deficiency. J Clin Endocrinol Metab. v.81, p. 601-06, 1996.

GLUECK, C. J.; DHARASHIVKAR, S.; WANG, P.; ZHU, B.; GASTRIDE, P.S.; TRACY, T.; SIEVE, L – Obesity and extreme obesity, manifest by ages 20-24 years, continuing through 32-41 years in women, should alert physicians to the diagnostic likelihood of polycystic ovary syndrome as a reversible underlying endocrinopathy. Eur J Obstet Gynecol Reprod Biol. v.122, p.206-212, 2005.

GOODARZI, M. O. – Looking for polycystic ovary syndrome genes: rational and best strategy. Semin Reprod Med. v.26, p. 5-13, 2008.

HIMELEIN, M.J. & THATCHER, S.S. – Polycystic ovary syndrome and mental health: a review. Obstet Gynecol Surv. v. 61, p. 723-32, 2006.

IBA´N˜ EZ, L.; JARAMILLO, A.; ENEIQUEZ, G.; MIRO, E.; LOPEZ-BERMEJO, A.; DUNGER, D.; de ZEGHER, F. – Polycystic ovaries after precociuos pubarche: ralation to prenatal growth. Hum Reprod. v.22, p. 395-400, 2007.

Iba´n˜ ez, L.; POTAU, N.; FRANCOIS, I.; de ZEGHER, F. – Precocious pubarche, hyperinsulinims, and ovarian hyperandrogenism in girls: relation to reduced fetal growth. J Clin Endocrinol Metab. v.83, p. 3558-62, 1998.

KAHSAR-MILLER, M. D.; NIXON, C.; BOOTS, L. R.; GO, R. C.; AZZIZ, R. – Prevalence of polycystic ovary syndrome (PCOS) in first-degree relatives of patients with PCOS. Fertil Steril. v.75, p. 53-58, 2001.

KOIOU, E.; TZIOMALOS, K.; DINAS, K.; KATSIKIS, I.; KALAITZAKIS, E.; DELKOS, D.; KANDARAKI, E. A.; PANIDES, D. – The effect of weight loss and treatment wirh metformin on serun vaspin levels in women with polycystic ovary syndrome. Endocrine Journal. v.58, n.4, p.237-46, 2011.

LAKHANI, K.; HARDIMAN, P.; SEIFALIAN, A. M. – Intima-media thickness of elastic and muscular arteries in young women with polycystic ovaries. Atherosclerosis. v.175, p. 353-59, 2004.

LEGRO, R.S. – The genetics of obesity. Lessons for polycystic ovary synhdrome. Ann NY Acad Sci. v. 900, p. 193-202, 2000.

LEGRO, R.S.; STRAUSS, J. F. – Molecular progress in infertility: polycystic ovary sybdrome. Fertil Steril. v.78, p. 569-76, 2002.

LUJAN, M.E.; BLOSKI, T.G.; CHIZEN, D. R.; LEHOTAY, D. C.; PIERSON, R.A. – Digit ratios do not serve as anatomical evidence of prenatal androgen exposure in clinical phenotypes of polycystic ovary syndrome. Hum Reprod. v.25, n.1, p. 204-11, 2010.

MORAN L. J.; NOAKES, M.; CLIFTON P. M.; NORMAN, R. J. – Dietry compsition in restorin reproctive and metabolic physiology in overweight women with polycystic ovary syndrome.  J Clin Endocrinol Metab. v.88, p. 812-19, 2003.

MORAN, L.; NORMAN, R. J. – Understanding and managing disturbances in insulin metabolism and body weight in women with polycystic ovary syndrome. Best Pract Res Clin Obstet Gynaecol. v.18, p.719-36, 2004.

MORAN, L.J.; MISSO, M.L.; WILD, R.A.; NORMAN, R.J. – Impaired glucose tolerance, type 2 diabetes and metabolic syndrome in polycystic ovary syndrome: a systemic review and meta-analysis. Hum Reprod Update. v.16, n.4, p. 347-63, 2010.

PANDOLFI, C.; ZUGARO, A.; LATTANZIO, F.; NECOZIONE, S.; BARBONETTI, A.; COLANGELI, M.S.; FRANCAVILLA, S.; FRANCAVILLA, F. – Low birth weight and later development of insulin resistence and biochemical/clinical features of polycystic ovary syndrome. Metabolism. v.57, p. 999-1004, 2008.

ROTTERDAM-GROUP – Revised 2003 consensus on diagnostic criteria ans long-term health risks related to polycystic ovary syndrome (PCOS). Hum Reprod. v.19, p. 41-47, 2004.

SHAW, L. J.; BAIREY MERZ, C. N.; AZZIZ, R.; STANCZYK, F. Z.; SOPKO, G.; BRAUNSTEIN, G. D.; KELSEY, S. F.; KIP, K. E.; COOPER-DEHOFF, R. M.; JOHNSON, B. D. – Postmenopausal women with a history of irregular menses and elevated androgen measuraments at high risk for worsening cardiovascular event-free survival. J Clin Endocrinol Metab. v.93, p. 1276-84, 2008.

TEEDE, H.; HUTCHISON S. K.; ZOUNGAS, S. – The management of insulin resistence in polycystic ovary syndrome. Trends Endocrinol Metab. v.18, p. 273-79, 2007.

THOMPSON, R. L.; BUCKLEY, J. D.; NOAKES, M.; CLIFTON, P. M.; NORMAN, R. J.; BRINKWORTH, G. D. – The effect of a hypocaloric diet with and without exercise training on body composition, cadiometabolic risk profile, and reproductive function in overweight and obese women with polycystic ovary syndrome.  J Clin Endocrinol Metab. v.93, n.9, p. 3373-80, 2008.

YILDIZ, B.O.; HAZNEDAROOLU, I.C.; KIRAZLI, S.; BAYRAKTAR, M. – Global fibrinolytic capacity is decreased in polycystic ovary syndrome, suggesting a prothrombotic state. J Clin Endrocrinol Metab. v.87, p.3871-75, 2002.
                                                                                                 

1 comentários: